Criminal

37 – Transtorno pedofílico e crimes sexuais

Transtorno pedofílico - Entenda a diferença entre pedofilia clínica e crimes sexuais. Critérios diagnósticos, leis (estupro de vulnerável), mitos, prevenção e orientação

Transtorno pedofílico e crimes sexuais – Em meio a manchetes impactantes e discussões inflamadas nas redes sociais, poucos assuntos reúnem tanta confusão conceitual quanto pedofilia e crimes sexuais contra crianças e adolescentes. A mistura de repulsa legítima, rótulos imprecisos e desconhecimento técnico costuma embaralhar três planos diferentes: o clínico, o jurídico e o comunicacional. É justamente essa confusão que prejudica a proteção de vítimas, dificulta a responsabilização correta de agressores e afasta das clínicas pessoas que poderiam buscar tratamento para reduzir riscos.


Parafilia, Transtorno Parafílico e Crime

Para que exista transtorno parafílico, precisa haver sofrimento clinicamente significativo, prejuízo pessoal relevante ou risco real de dano a terceiros na satisfação daquele interesse. O que a clínica avalia é se há prejuízo para o indivíduo ou risco para outras pessoas. O que o direito penal avalia é a conduta: o que foi feito, com quem, em que circunstâncias, com que resultado.

Parafilia é o termo técnico para um interesse sexual atípico. Ele pode envolver práticas (atividades eróticas específicas) ou alvos (quem ou o que desperta o interesse). Já transtorno parafílico só existe quando esse interesse causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo ao indivíduo, ou implica dano ou risco de dano a outras pessoas.

Em outras palavras: a existência de uma parafilia é condição necessária, mas não suficiente para um diagnóstico de transtorno parafílico. Nem todo interesse atípico, no entanto, é um transtorno.

Aplicando essa lógica ao tema deste artigo: alguém pode apresentar interesse sexual por crianças e não cumprir critérios de transtorno, se não age sobre o impulso e não sofre prejuízo funcional relevante. Clinicamente, essa pessoa teria uma parafilia pedofílica (ou “orientação pedofílica”, nos textos que usam essa nomenclatura), mas não transtorno pedofílico.

Essa distinção é fundamental por dois motivos. Primeiro, ela protege a precisão clínica e evita diagnósticos precipitados. Segundo, ajuda a separar o debate clínico do jurídico: condutas são julgadas pela lei; desejos, não.


O Que é Pedofilia

Do ponto de vista técnico, pedofilia se refere a interesse sexual por crianças pré-púberes. O diagnóstico de transtorno pedofílico requer, entre outros elementos, a presença por pelo menos seis meses de fantasias, impulsos ou comportamentos intensos e recorrentes com foco em crianças, sofrimento ou prejuízo decorrente disso, ou a prática de condutas que coloquem terceiros em risco.

Há ainda um recorte etário: o indivíduo avaliado tem no mínimo 16 anos e é ao menos cinco anos mais velho do que a criança que ocupa o foco do interesse. Esse recorte serve para diferenciar descobertas sexuais típicas da adolescência de padrões que sinalizam risco específico.

Os manuais diagnósticos mais usados em saúde mental adotam critérios que, em linhas gerais, incluem:

  1. Tempo e conteúdo: por pelo menos seis meses, o indivíduo apresenta fantasias, impulsos ou comportamentos recorrentes e intensos envolvendo atividade sexual com crianças pré-púberes (em geral, até 13 anos no recorte clínico do desenvolvimento).
  2. Sofrimento ou prejuízo: o indivíduo age sobre os impulsos ou experimenta sofrimento intenso e dificuldades interpessoais por causa deles.
  3. Idade e diferença etária: o diagnóstico não se aplica a menores de 16 anos, e requer que a pessoa seja pelo menos cinco anos mais velha do que a criança envolvida nas fantasias ou comportamentos.

Esses critérios foram desenhados para serem aplicados tanto a quem admite o interesse sexual por crianças quanto a quem o nega, quando há evidências objetivas que apontam nesse sentido. A avaliação clínica séria considera contexto, histórico, entrevistas e, quando cabível, dados complementares.


Idade Clínica Versus Idade Legal

Clinicamente, fala-se em alvo pré-púbere, em geral treze anos ou menos, o que é diferente da definição legal de vulnerabilidade. No Código Penal, a figura do vulnerável por idade se estabelece para menores de 14 anos, e esse marco tem efeitos diretos na tipificação do crime. O fato de a clínica operar com marcos do desenvolvimento não altera o que a lei define como crime ao proteger quem não tem discernimento para consentir.

No desenvolvimento humano, costuma-se chamar de pré-púberes as crianças até cerca de 12/13 anos. Já na legislação penal brasileira, a noção central para tipificação de certos crimes é a de vulnerabilidade legal, que abrange menores de 14 anos (e também pessoas de qualquer idade sem discernimento ou capacidade de resistência). Confundir os dois recortes gera erro na análise clínica e, pior, confusão na leitura da lei.


Subtipos Clínicos e Especificadores

Na prática clínica, há pessoas com atração exclusiva por crianças, e há pessoas que combinam atração por crianças e por adultos. Também se especifica se o desejo é dirigido a meninos, meninas, a ambos, ou se se restringe ao contexto intrafamiliar. Essas distinções não atenuam responsabilidade; elas orientam avaliação de risco, estratégias de tratamento e medidas de contenção quando necessárias.

  • Tipo exclusivo: interesse sexual apenas por crianças.
  • Tipo não exclusivo: interesse sexual por crianças e adultos.

E ainda se pode indicar alvos preferenciais (meninos, meninas, ambos) e se há limitação ao incesto (ocorrências restritas a membros da família). Em contexto forense, esse detalhamento ajuda a avaliar risco, pensar estratégias de manejo e orientar decisões judiciais e terapêuticas com mais sustentação técnica.


O Impacto Do Reconhecimento
E Da Negação Na Avaliação

Algumas pessoas admitem abertamente ter interesse por crianças e relatam sofrimento por conta disso, sem histórico de passagem ao ato. Outras negam qualquer interesse, ainda que documentos e provas apontem contatos sexuais com múltiplas crianças em ocasiões distintas.

A avaliação clínica considera o relato, mas se ancora em evidências, histórico, convergência de indicadores e, quando cabível, no exame de condutas objetivas como o consumo ilegal de material com crianças, que além de crime costuma refletir preferências.


Pedofilia Não É Um Tipo Penal

Apesar da expressão ter se popularizado no noticiário, “crime de pedofilia” não existe como figura no Código Penal. O que a lei pune são condutas enquadradas nos crimes contra a dignidade sexual. Manter conjunção carnal ou praticar ato libidinoso com menor de 14 anos é estupro de vulnerável.

O consentimento não é juridicamente relevante nessa faixa etária, tampouco a autorização familiar ou o histórico sexual prévio da vítima. Também é crime induzir alguém menor de 14 anos a satisfazer a lascívia de outrem, praticar ato sexual na presença de menor de 14 anos para excitação própria ou alheia, submeter ou atrair menor de 18 anos à prostituição ou exploração sexual e produzir, vender, comprar, compartilhar, publicar ou armazenar material pornográfico envolvendo crianças e adolescentes.

Se houver lesão grave ou morte, as penas aumentam. Em contextos de exploração, proprietários e responsáveis por estabelecimentos também respondem.


Nem Todo Agressor De Crianças é Pedófilo

A psicologia investigativa mostra perfis variados entre ofensores. Há quem seja movido por sadismo, com excitação ancorada na dor, na humilhação e no controle, e não na idade da vítima. Há quem aja por oportunidade e vulnerabilidade de acesso, direcionando o desejo a quem estiver disponível, inclusive crianças, sem preferência sexual por elas. Há ainda o papel desinibidor do álcool e de outras drogas, que podem reduzir controle inibitório e julgamento, aumentando o risco de abordagem indevida.


Prevalência e Subnotificação

Estimativas de prevalência do transtorno pedofílico entre homens são baixas, mais incertas entre mulheres, e sofrem com subnotificação. Isso não contradiz a quantidade de crimes noticiados. Significa que parte desses crimes não decorre de interesse preferencial por crianças, e sim de outras dinâmicas criminais e psicossociais. Distinguir corretamente o perfil de risco melhora a prevenção e orienta medidas específicas para cada cenário.


O Curso Ao Longo Da Vida – Negações, Relatos e Indícios


Relatos clínicos frequentemente situam o surgimento do interesse por crianças por volta da puberdade, junto com a descoberta do interesse por adultos. Com o passar dos anos, a intensidade do impulso pode diminuir em alguns casos, acompanhando mudanças da libido, ou aumentar na presença de gatilhos como separação, perda de emprego, aposentadoria compulsória, estresse crônico e declínio neurocognitivo. Mapear esses fatores não é indulgência; é parte do gerenciamento de risco.

Há pessoas que assumem expressamente o interesse sexual por crianças, descrevendo que é igual ou maior do que o interesse por adultos. Outras negam, ainda que tenham se envolvido em contatos sexuais com menores; nessas situações, peritos e clínicos procuram evidências convergentes (histórico, padrões de busca por pornografia ilegal, relato de terceiros, circunstâncias repetidas).

Muitos homens que cumprem critérios de transtorno pedofílico relatam perceber o interesse por crianças na puberdade, mais ou menos no mesmo período em que notam o interesse por homens ou mulheres. A partir daí, o curso é variável. A libido pode oscilar com a idade, a saúde física e fatores psíquicos. Há relatos de pessoas que controlam impulsos por décadas e rompem esse controle após gatilhos como aposentadoria compulsória, perda de papel social, estresse extremo ou declínio cognitivo.

Casos de idosos que cometem o primeiro crime de violência sexual contra criança, embora não sejam a maioria, existem. Dois cenários costumam aparecer nas narrativas clínicas e forenses: indivíduos que sempre tiveram fantasias e perderam controle mais tarde, e indivíduos cuja capacidade de inibição foi comprometida por doenças neurocognitivas. Em qualquer caso, a abordagem correta é individualizada e baseada em avaliação séria.

Um ponto delicado: o consumo de pornografia infantil é crime e, clinicamente, costuma ser tomado como indicador útil de interesse pedofílico. É uma pista, não prova diagnóstica isolada. Profissionais sérios investigam o que exatamente na imagem atrai a pessoa (infância, vulnerabilidade, dominação, violência) e analisam o quadro com cuidado — sem relativizar a criminalidade inerente à produção, circulação e posse desse material, que sustenta um mercado de abuso real.


Abusador e Molestador

A prevalência populacional do transtorno pedofílico é desconhecida. Estimativas em homens variam em percentuais baixos e têm ampla margem de incerteza; em mulheres, há menos dados ainda. A impressão de que “é muito comum” nasce, em parte, da alta exposição midiática de crimes e da confusão terminológica.

Nem todo crime sexual contra criança é cometido por alguém com transtorno pedofílico. Há ofensores motivados por sadismo, oportunidade e vulnerabilidade da vítima. Também há quem busque satisfação sexual indiscriminada e viole a pessoa que estava disponível, independentemente de ser criança, adulta com deficiência, ou alguém incapacitado por álcool e drogas. Em linguagem simples: alguns agressores não têm interesse específico por crianças; eles abusam de quem podem.

  • Abusador: usa táticas mais sutis (carícias, toques por cima da roupa, indução a toques) e pode evitar sinais físicos evidentes. É menos visível no curto prazo, mas não menos violento no impacto psíquico.
  • Molestador: age de forma mais invasiva, com maior probabilidade de consumar o ato sexual e deixar vestígios, o que pode acelerar a denúncia.

A distinção não muda a gravidade do dano, mas ajuda a mapear risco, medidas protetivas e estratégias de responsabilização.

A vulgarização da ideia de que “todo abusador é pedófilo” erra clinicamente e atrapalha a prevenção. Medidas eficazes precisam de diagnóstico preciso e respostas diferentes para perfis distintos de risco e motivação.

No cotidiano da justiça e dos serviços de proteção, a linguagem descritiva ajuda. Há ofensores que operam por abusos sutis, muitas vezes sem marcas físicas, explorando carícias encobertas, manipulação emocional e confusão. Há outros que praticam atos invasivos consumados, com maior chance de sinais clínicos imediatos e denúncia. Em ambos os casos, as consequências psíquicas para as vítimas podem ser devastadoras, e a resposta institucional deve ser célere, técnica e acolhedora.


Pornografia Infantil: “Só Ver”
É Participar Da Violência

Toda imagem ou vídeo de criança em ato sexual é resultado de abuso real. Consumir, guardar, compartilhar, “apenas encaminhar” é alimentar a demanda e manter vítimas reais sendo exploradas para abastecer esse mercado. Não há gradação moral que relativize isso.
Há exceções estritas em contexto jornalístico, científico, cultural ou acadêmico, com anonimização e finalidade legítima — e ainda assim, são situações raras, reguladas e que exigem rigor ético.


Fatores De Risco e Comorbidades

Alguns elementos associados aumentam a probabilidade de sair da imaginação e praticar o ato:

Traços antissociais
Indivíduos com transtorno de personalidade antissocial tendem a desrespeitar normas e direitos alheios, o que pode favorecer o passo do impulso à ação. Em perfis assim, o risco se eleva mesmo quando o interesse sexual predominante é por adultos; a escolha da vítima recai sobre quem está vulnerável.

Álcool e drogas
A desinibição provocada por substâncias pode reduzir barreiras e aumentar a impulsividade, facilitando condutas que a pessoa não teria em estado sóbrio. Em avaliação forense, distinguir se a substância foi gatilho suficiente ou apenas retirou o freio de impulsos preexistentes é crucial para prevenção de reincidência.

Transtorno obsessivo-compulsivo (TOC)
Há pessoas com TOC que relatam pensamentos intrusivos egodistônicos envolvendo crianças, sem correlação com excitação sexual real. A clínica experiente reconhece esse quadro para não confundir obsessões com interesse sexual pedofílico.

Histórico de vitimização
Ter sido abusado na infância pode aparecer em históricos de ofensores, mas não determina que a pessoa se torne agressora. É fator de risco, não destino. Há vítimas que nunca se tornam ofensores e ofensores que nunca foram vitimizados.


Comunicação Pública Responsável

Tratar qualquer abuso como “crime de pedofilia” parece simples, mas atrapalha. O termo técnico “estupro de vulnerável” direciona corretamente a ação policial e judicial, evita nulidades e educa a população sobre o que é punido e por quê.

No ambiente digital, reforçar que é crime produzir, transmitir, armazenar e compartilhar material de abuso infantil é medida essencial de prevenção. Cada encaminhamento em grupos de mensagens alimenta mercados criminosos e revitimiza pessoas.


Educação Sexual, Família e Escola

A melhor prevenção passa por informação apropriada à idade e por adultos capacitados a reconhecer sinais. Crianças e adolescentes precisam saber identificar situações impróprias e pedir ajuda. Responsáveis e educadores devem entender que abaixo de 14 anos não existe consentimento válido. Ao menor sinal, os fluxos de notificação devem ser acionados com responsabilidade, preservando a privacidade e a dignidade das vítimas.


Avaliação Forense

Entrevistas em contexto pericial exigem técnica e independência. Há quem negue tudo apesar de provas robustas. Há quem confesse fantasias sem ter histórico de passagem ao ato. Indicadores psicofisiológicos, quando disponíveis, podem ser auxiliares, mas não substituem a avaliação clínica ampla, o levantamento de antecedentes, a análise contextual e a integração com dados objetivos. O laudo útil ao Judiciário é aquele que separa com rigor o que é observado, o que é relatado e o que é interpretado.


Tratamento e Manejo Clínico

Não há “cura” para preferências sexuais. O que existe é manejo com psicoterapia, desenvolvimento de estratégias de autocontrole, reorganização de rotinas, redução de fatores de risco, farmacoterapia em casos selecionados e, quando necessário, medidas judiciais que limitam o acesso a potenciais vítimas.

Programas de prevenção primária que oferecem atendimento confidencial a quem reconhece risco e deseja não ofender contribuem para evitar crimes, desde que caminhem lado a lado com a punição rigorosa de condutas criminosas.


Como Alinhar Clínica e Dever Legal

Quem percebe em si um risco pode se afastar dos serviços de saúde por medo de ser imediatamente denunciado ao procurar orientação. Comunicação pública precisa deixar claro que pensamentos não são crime, mas que qualquer indício de ato, preparação de ato, aliciamento ou material envolvendo crianças deve ser reportado. Informar corretamente abre caminho para que quem precisa de contenção clínica chegue antes do dano, sem que isso empaque a obrigação legal de comunicar crimes.


O Que Fazer Diante De Conteúdo Ilegal Na Internet

A orientação é direta: não baixe, não armazene, não compartilhe, não “envie para avisar”. Faça denúncia pelos canais oficiais, use as ferramentas de reporte das plataformas e preserve os dados para as autoridades quando requisitado. Sites educativos e veículos de imprensa devem ter políticas claras de moderação e remoção imediata, além de indicar rotas de denúncia e serviços de apoio às vítimas.


Mitos Que Atrapalham a Prevenção

Dois equívocos aparecem com frequência. O primeiro é supor que todo agressor foi vítima de violência sexual na infância. O segundo é imaginar que todo consumo de material ilegal decorre do mesmo motivo. Existem ofensores que usam esse material para se excitar e há quem circule por descaso, voyeurismo, ganhos financeiros ou bravata. Em todos os casos, a conduta é criminosa e alimenta uma cadeia de exploração que produz novas vítimas.


Pedofilia é crime?

Não. O ordenamento jurídico brasileiro não tipifica “pedofilia” como crime. O que a lei pune são condutas: conjunção carnal ou outros atos libidinosos com menor de 14 anos; induzir menores a satisfazer a lascívia de outrem; expor crianças a atos sexuais; exploração sexual e prostituição de menores de 18 anos; produção, posse, troca e divulgação de conteúdo sexual envolvendo crianças e adolescentes; entre outras figuras penais previstas.

Se uma pessoa entra numa delegacia e declara: “Eu sinto desejo por crianças”, mas nunca tocou em uma criança, nunca produziu ou consumiu pornografia infantil e não praticou qualquer ato descrito no Código Penal, não há conduta a punir. A recomendação correta é tratamento especializado. A criminalização recai sobre atos, não sobre pensamentos.

Esse ponto não relativiza perigos. Ao contrário: precisão jurídica e precisão clínica fortalecem a proteção de crianças, direcionam melhor a investigação e facilitam a denúncia eficaz.


O Que a Lei Brasileira Prevê

Estupro de vulnerável (art. 217-A do Código Penal)
Configura-se quando há conjunção carnal (penetração peniana na vagina) ou outro ato libidinoso com menor de 14 anos, ou com pessoa de qualquer idade que não tenha discernimento para o ato, ou não possa oferecer resistência (por exemplo, por deficiência intelectual, enfermidade, inconsciência).
A pena base é de 8 a 15 anos de reclusão. Se houver lesão corporal grave, vai para 10 a 20 anos. Se houver morte, 12 a 30 anos.
O consentimento não tem validade jurídica quando a vítima é menor de 14 anos. Não importa se a família “permitiu” ou se havia um “namoro”. A lei parte do princípio de proteção integral.

Induzir menor a satisfazer a lascívia de outrem (art. 218)
É crime manipular ou induzir alguém menor de 14 anos a realizar qualquer ato sexual para satisfazer outrem. A responsabilidade recai tanto sobre quem induz quanto sobre quem se satisfaz com o ato.

Expor criança a atos sexuais (art. 218-A)
Praticar, na presença de menor de 14 anos, conjunção carnal ou outro ato libidinoso, ou induzir a criança a presenciar tais atos para satisfazer a lascívia própria ou alheia, é crime. Atenção: casais em situação de vulnerabilidade habitacional, por exemplo, não se enquadram automaticamente nesse artigo se a presença da criança não for o objetivo de satisfação (ainda que a situação requeira orientação e proteção no âmbito sociofamiliar).

Exploração sexual e prostituição de menores (art. 218-B)
Submeter, induzir ou atrair menor de 18 anos à prostituição ou outra forma de exploração sexual, facilitar, impedir ou dificultar que abandone essa condição é crime.
Quem faz programa com menor de 18 anos dentro desse contexto também incorre em crime, mesmo que o menor tenha mais de 14 anos.
Proprietários e gerentes de locais onde ocorre exploração respondem; a cassação de licença do estabelecimento pode ser efeito da condenação.

Conteúdos ilícitos (art. 218-C e correlatos do ECA)
Oferecer, trocar, transmitir, vender, expor, distribuir, publicar ou divulgar imagens ou vídeos que contenham cena de estupro ou de estupro de vulnerável, façam apologia ou induzam a prática, ou divulguem cena de sexo, nudez ou pornografia sem consentimento da vítima, é crime.
A pena aumenta se o autor mantém ou manteve relação íntima com a vítima (casos de revenge porn, por exemplo).

Em todos esses eixos, a cadeia de produção e consumo de conteúdo sexual envolvendo crianças e adolescentes é crime. Quem “apenas compartilha” em grupos de mensagens não é “apenas”: também pratica delito e alimenta um mercado de violência real.


Transtorno pedofílico é diagnóstico clínico que exige critérios objetivos e não coincide automaticamente com crime. Pedofilia, como conceito clínico, não é tipo penal. O que a lei brasileira pune é a prática de atos sexuais com menor de 14 anos, a exploração sexual de menores, a indução de crianças a presenciar ou participar de atos sexuais e a circulação de imagens de abuso e de nudez não consentida.

Nem todo agressor sexual de crianças é de fato um pedofílo; há violência por poder, sadismo, oportunidade e desinibição por substâncias. Distinguir não ameniza a gravidade; direciona a prevenção, o tratamento e a punição para onde são mais eficazes.

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